“Ao cabo de séculos de «escravidão» a mulher quis pois ser livre, ser ela própria. Mas o «femininismo» não soube conceber para a mulher uma personalidade que não fosse uma imitação da masculina, de maneira que as suas «reivindicações» ocultam uma desconfiança fundamental da mulher nova em relação a si mesma, a impotência desta para ser o que é e a contar pelo que ela é: como mulher e não como homem. Devido a esta fatal incompreensão, a mulher moderna experimentou o sentimento de uma inferioridade absolutamente imaginária por ser apenas mulher e sente quase como ofensa o ser tratada «só como mulher». Foi esta a origem de uma falsa vocação frustrada: e é precisamente por isso que a mulher quis tirar uma desforra, reivindicar a sua «dignidade», mostrar o seu «valor» - passando a medir--se com o homem. Todavia, não se tratava de maneira nenhuma do homem verdadeiro, mas sim do homem-construção, do homem-fantoche de uma civilização standardizada, racionalizada, não implicando quase mais nada de diferenciado e qualitativo. Numa civilização como esta, evidentemente, já não se pode tratar de um privilégio legítimo qualquer, e as mulheres incapazes de reconhecer a sua vocação natural e de defendê-la, a não ser pelo plano mais baixo (pois nenhuma mulher sexualmente feliz sentiu alguma vez a necessidade de imitar e de invejar o homem), conseguiram facilmente demonstrar que também elas possuíam virtualmente as faculdades e as habilitações - materiais e intelectuais - que se encontram no outro sexo e que, em geral, se exigem e se apreciam numa sociedade de tipo moderno. O homem, de resto, deixou andar as coisas como um verdadeiro irresponsável, e até ajudou e impeliu a mulher para as ruas, para os escritórios, para as escolas, para as fábricas e para todas as encruzilhadas contaminantes da sociedade e da cultura modernas. Foi assim que se deu o último empurrão nivelador. (…) A mulher tradicional, a mulher absoluta, ao dar-se, ao não viver para si, ao querer ser toda para outro ser com simplicidade e pureza, realizava-se, pertencia-se a si mesma, tinha um heroísmo muito seu - e, no fundo, tornava-se superior ao homem comum. A mulher moderna ao querer ser por si mesma destruiu-se. A tão aspirada «personalidade» está a tirar-lhe toda a personalidade.”

Revolt Against the Modern World

Última atualização 24 de Setembro de 2021. História

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“O destino de uma mulher é ser mulher.”

Clarice Lispector (1920–1977) Escritora ucraniano-brasileira
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“Todos os romances são, ou deveriam ser, escritos para que tanto homens quanto mulheres o leiam; e eu não saberia o que dizer ao tentar conceber como um homem se permitiria escrever algo que pudesse ser realmente ofensivo para uma mulher ou por que uma mulher devesse ser censurada por escrever algo que fosse próprio e adequado para um homem.”

Anne Brontë (1820–1849)

Prefácio da autora á segunda edição, A Inquilina de Wildfell Hall‎‎ - Página 6, Anne Brontë, traduzido por Michelle Gimenes, Editora Pedrazul, 2014, ISBN 9788566549133 - 368 páginas

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“A inferioridade da mulher não é fisiológica, nem psicológica; ela é social. Sua escravidão sexual determina sua dependência econômica.”

Francisca Praguer Fróes (1872–1931)

Em prol do voto feminino. A Tarde, Salvador, 6/7/1917, como citado em "Outras falas: feminismo e medicina na Bahia (1836-1931)" - página 197, de Elisabeth Juliska Rago, Editora Annablume, 2007, ISBN 8574197238, 9788574197234, 273 páginas

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