Frases de Casimiro de Brito

“Se os outros me abandonam é porque devo estar a aproximar-me do essencial.”

“Amar-te é decifrar humildemente um enigma que não tem decifração porque a todo o momento as águas passam e bebê-las e banhar-me nelas é bom e não há mais nada.”

“Apenas a consciência da mortalidade pode conduzir à convivência da imortalidade, à aceitação desprendida do trânsito da matéria.”

“A sabedoria humana. Uma gota de água no oceano da sabedoria universal.”

“Uns sofrem, outros julgam que são felizes.”

“Olhasses tu o mundo na perspectiva da rã ou da relva e serias tão humilde e discreto como elas.”

“Dizem uns que perderam o mundo, outros que nele se perderam, como se alguém alguma vez tivesse agarrado o fio desta meada.”

“Se o mundo contém tudo não preciso de nada.”

“Adormecem os que triunfam. Adormecem ou são aniquilados pela bárbara irrupção dos que na sombra encarnam o vigor nascente e necessário para que o espírito do mundo se cumpra.”

“Neste mundo há apenas um habitante. Um habitante solitário que, sem nada possuir, é presenteado com todos os nomes.”

“A perfeição, para a mulher, reside no nascimento: de si própria ou de outro ser de si. Para o homem a perfeição reside na morte.”

“O homem é uma espécie fantástica. Apesar de ter enlouquecido consegue administrar o hospício onde mora, este palco flutuante que é, ao mesmo tempo, casa de armas e selva paradisíaca.”

“Um homem cai, desfigura-se, perde o peso e a glória. Mas levanta-se depois de cada queda e talvez já nem seja um homem, talvez seja essa a sua verdadeira ascese.”

“Um homem leva mais tempo a desaprender o que não faz falta do que a aprender o cisco da vida. Mas então o tempo já não conta.”

“Em cada homem um deus escondido, uma forma perfeita que se esconde - que se perdeu - numa aldeia de demônios.”

“A dignidade com que morrem os animais: não têm nada para deixar.”

“O tempo de que disponho: único património em que a contagem é sempre decrescente. Pelo menos enquanto não aprender a libertar-me de mim.”

“Quem sabe amanhã o que foi hoje, hoje o que será amanhã? Espuma à tona de água.”

“Há mais realidade no vazio, na cerimónia em que se tece o vazio, do que na história.”

“Ainda que a verdade estivesse sentada não deixaria de ser flutuação.”

“A paz só a conhece quem sofreu todos os desastres. O que me cabe, depois de alguns desastres, é apenas o caminho arenoso da paz. Este momento.”

“O amor é quase impossível. Terá de ser límpido, fecundo e desinteressado. De ambos os lados.”

“Bela, a forma do vaso. Mas é no seu vazio que se conserva o vinho.”

“O poder dos outros não nos oprime mais do que o exercício do poder próprio. Falsos poderes.”

“Ainda a humildade. Não se mostra nem se afirma nem se profere. Aproxima-se do silêncio.”

“Amar-te é aceitar que já não és a mesma, que todos os dias te afastas por caminhos que não conheço mas que não acabas nunca.”

“A verdade não existe. Apenas se transmite o erro, a errância do movimento.”

“Amei a vida inteira e sei de cor as leis do amor. Umas são de pedra, outras de água transparente. A vida inteira e não sei ainda o caminho.”

“Nem todos os que se refugiam na nulidade ou na solidão o fazem por cansaço e desistência das provas do mundo. Há também quem se afaste para evitar a baba e o louvor dos cretinos.”

“Sábios, cheios de que sabedoria? Roídos por ela. Não sabem nada.”

“São raros os que aderem ao ritmo. Uns nascem mortos, outros póstumos.”

“O que se odeia não é um objecto mas o seu envelhecimento. Quando não se aprendeu a ler o objecto novo que nele se instala.”

“Vocação masoquista da natureza: consentiu que o vírus humano a invadisse e sobrevivesse.”

“A suprema condenação não é a morte, símbolo e princípio da errância infinita, mas a sua impossibilidade.”

“O belo? Início do terrível.”

“Triunfo? Coisa que não há - sequer o triunfo da morte - neste mundo em que tudo flui.”

“Suportem-se então os prazeres do amor e da amizade. O principal deles é o de se ter alguém à mão para exercitar a nossa vocação sadomasoquista.”

“Acreditar em mim, no meu clã, é pura tolice. Se até a pedra em que me sento diante do mar é devorada pelo vento!”

“Cala-se o sábio quando julga ter encontrado a verdade. Humildemente se cala. Tanto orgulho.”

“Quando vi Deus foi um pássaro que eu vi. Um pássaro com os olhos furados.”

“Cessa o desejo quando o muro se abre? Tanta imaturidade.”

“Acaba a humildade mal se pronuncia o seu nome.”

“A História é sempre histérica. Obsessivo o cosmos.”

“Se sou também o outro poderei deixar de me sentir responsável pelo mal que «me» fazem?”

“Não é o silêncio quando silenciamos com esse que amamos.”

“Ah, o amor! Esta luta mortal! Cuidar de nós é enterrar definitivamente o eu e o tu que um dia fomos.”

“O amor? Sabemos de ciência tão certa (esse instinto) que vai morrer, que levamos a vida inteira a polir a pedra da sua memória.”

“Ambição suprema: aprender a aprender.”

“Próprio do amante é destruir quem ama, beber as águas novas que do corpo amado se levantam e deixar-se inundar por elas. Um concílio de duas destruições.”

“Poderei acaso consentir que as coisas - ou o desejo que tenha delas - me afastem de mim?”

“Raramente leio jornais. O que dizem ter acontecido ontem já aconteceu há muito tempo.”

“O silêncio, o que é o silêncio? perguntei ao mestre. - Uma floresta cheia de ruído.”

“A beleza mais discreta não responde nem interroga.”

“Apodrece na posse o que floresce no desejo.”

“Não são propriamente os homens que me horrorizam mas as suas obras, as suas máscaras. Salvam-se Buda, Basho, Bach e poucos mais.”

“O mais raro de todos os luxos: a privação.”

“O peso do pensamento (uma teia de mitos) só o sentes quando ele nomeia a terra frágil do sofrimento. Um corpo que seja também o teu corpo.”

“Ideia clara, ideia morta.”

“As verdades são amargas e bebem-se gota a gota. Mas a mentira, que nos lisonjeia como se fôssemos o sal da terra, engolimo-la às golfadas.”