“Tenho sonhado mais que o que Napoleão fez.Tenho apertado ao peito hipotético mais humanidades do que Cristo,Tenho feito filosofias em segredo que nenhum Kant escreveu.Mas sou, e talvez serei sempre, o da mansarda,Ainda que não more nela;Serei sempre… o que não nasceu para isso;Serei sempre… só o que tinha qualidades;Serei sempre o que esperou que lhe abrissem a porta ao pé de uma parede sem porta,E cantou a cantiga do Infinito numa capoeira,E ouviu a voz de Deus num poço tapado.Crer em mim? Não, nem em nada.” Fernando Pessoa (1888–1935) poeta português De segredo , De deus , Cristo
“Quando enfim eu nasci minha mãe embrulhou-me num manto Me vestiu como se fosse assim uma espécie de santo Mas por não se lembrar de acalantos, a pobre mulher Me ninava cantando cantigas de cabaré” Chico Buarque (1944) compositor, cantor e escritor brasileiro De mulheres , Cantando
“Digo o que penso e, muito simplesmente enuncio factos pois que, apesar de poetisa, ligo bem maior importância aos factos do que às palavras por bonitas que sejam. Palavras são como as cantigas: leva-as o vento.” Florbela Espanca (1894–1930) poetisa portuguesa
“Os tristes, os deserdados, os pobres, os oprimidos, quando tudo lhes falta, o pão, o lume, o vestido, têm sempre, no fundo da alma, uma cantiga pequena que os consola, que os aquece, que os alegra. É a última coisa que fica no pobre. E então a cantiga vale mais do que todos os poemas.” Eça de Queiroz (1845–1900) Escritor e diplomata português Alma
“Horrífera ecnefia e flores de lágrimas cobertasFiníssima madeira untada com verniz francêsTudo tão ocasional e tão sofisticadoPara ser visto pela última vezMalditas notas capazes de despir minha tristezaE contemporizar meus célebres ídolos mórbidos e celestiaisAlmas veladas pelo abismo dessa corte de mentirasE apagadas pelas soberbas torturas lacrimaisE tudo se faz mórficos e magnificência de ébanos sociaisVida de luxúria e devastaçãoConsumismo e deploraçãoPulsando com a mente em tempos gastosPensando com sentimentos o coraçãoOh, malditas notas que me envergonham ao ócio do incapazEm minhas teclas e cordas com dores em velas acabadasTudo como vinhos tintos dessas veias mortaisE tudo em prantos negros agora se fazNós devoramos nossos antepassadosA cada diária alimentaçãoRetiramos da terra os que foram enterradosE excretamos de novo tudo pelo chãoE toda matéria se renovaDa terra crescemos destruindoPela terra seremos destruídosE devorados seremos destituídosAlmas festivas dessas palavras lançados ao túmuloTudo em lúgubres vestes de réquiem se desfazAgora e o sempre. O hoje, o ontem e o nunca maisAté tardar minhas histórias criadas no amanhã vermelhoTudo como toques de lágrimas perdidas em prantos eternaisHorrífera ecnefia desta festa finalCantigas lúgubres desses coros celestiaisPerdidas e embebidas nos fins dos sinaisO hoje, o sempre e o nunca mais.” Abraham Cezar Coração , Vinho , Flores , História