
„Ora se enunciará o que deveria ser fingindo-se acreditar ser precisamente o que é. Nisso consiste a ironia. Ora, pelo contrário, se descreverá cada vez mais meticulosamente o que é, fingindo-se crer que assim é que as coisas deveriam ser. É o caso do humor. O humor, assim definido, é o inverso da
ironia. Ambos são formas da sátira, mas a ironia é de natureza retórica, ao passo que o humor tem algo de mais científico. Acentua-se a ironia deixando-se arrastar cada vez mais alto pela idéia do bem que deveria ser. Por isso a ironia pode aquecer-se interiormente até se tornar, de algum modo, eloqüência sob pressão. Acentua-se o humor, pelo contrário, descendo-se cada vez mais baixo no interior do mal que é, para lhe notar as particularidades com mais fria indiferença. Vários autores, entre os quais Jean Paul, observaram que o humor gosta dos termos concretos, dos pormenores técnicos,, dos fatos rigorosos. Se nossa análise estiver certa, não se trata de um feitio casual do humor, mas nisso consiste a sua própria essência. O humorista é no caso um moralista disfarçado em cientista, algo como um anatomista que só faça dissecação para nos
desagradar; e o humor, no sentido restrito que damos à palavra, é de fato uma transposição do moral em científico.“
— Henri Bergson, livro Laughter
Laughter: An Essay on the Meaning of the Comic